Calamidade particular

Tudo começa como efeito dominó: a peça estudo empurra a do trabalho, trabalho empurra dinheiro, dinheiro despenca em gastos. E aí vem a palavra que você não queria ouvir – dívidas. Dívidas são um sinônimo bem-educado para estar fodido. Não há glamour no vermelho. É só um abismo com juros compostos.


É seca ou enchente: uma calamidade inevitável. Problemas nunca vêm sozinhos – eles têm parentes, uma maldita genealogia de caos. Crise? Não é pessoal. É global. Terceiro Mundo está como pano de fundo, a voz da ansiedade como trilha sonora.


E quando você acha que não pode piorar, o cansaço bate à porta. O tipo de cansaço que não te deixa dormir, só te faz acordar surdo de tanto barulho interno. Então você faz a única coisa que parece lógica: foge. Para o bar, para a pista, para qualquer lugar onde as luzes piscam e as paredes vibram. Você dança como se o inferno fosse um verbo transitivo.


E por um momento, você acredita. Que o pior já passou. Que tudo está sob controle. Mas a vida ri na sua cara, aquela música de sofrência segue no repeat e coloca os problemas de volta no palco principal. Não há escapatória. É como gritar debaixo d’água: ninguém ouve, e você só afunda mais.


Então você faz o que qualquer pessoa razoável faria. Você canta. Você dança. Você ri. Você se destrói, se reconstrói, e continua, porque a única alternativa é parar. Mas nada para. Nada nunca para.


A música? Continua. Os problemas? Continuam. Você? Você finge que está tudo bem. Porque o show tem que continuar, e o palco não vai se esvaziar sozinho.


Fellype Alves

event segunda-feira, 16 de dezembro de 2024
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